terça-feira, 28 de dezembro de 2010

O espelho de um guarda-roupa.


(...)

II

Um homem
com um espelho (feito
um segundo esqueleto)
embutido no corpo
não pode
bruscamente voltar-se para trás
não pode
juntar nada do chão
e quando dorme
é como um acrobata
estendido sobre um relâmpago

Um homem com um espelho
enterrado no corpo
na verdade não dorme: reflete
um vôo

Enfim, esse homem
não pode falar alto demais porque os espelhos só guardam
(em seu abismo)
imagens sem barulho

III

Carregar um espelho
é mais desconforto que vantagem:
a gente se fere nele
e ele
não nos devolve mais do que a paisagem

Não nos devolve o que ele não reteve:
o vento na copas
o ladrar dos cães
a conversa na sala
barulhos
sem os quais
não haveria tardes nem manhãs

Ferreira GULLAR!



4 comentários:

  1. Sobre várias perspectivas, além da própria imagem que queremos ver a nossa volta; mesmo que seja pálida, que seja silenciosa. É preciso ver também nesse texto o título, fascinante!
    - O espelho do guarda-roupa -
    Ou seja, além de sermos o que vestimos, queremos ser imagem e semelhança do que reflete!

    rsrsr
    Um bom poema, crítico! ... é GULLAR!!

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  3. Lindíssimo querida!!

    Li e gostei, Te sigo(só não vi a lista de seguidores)!!... se puder, visita minha página, seria uma honra tê-la como seguidora.

    PAZ!!!!!

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  4. Ele é maravilhosoooooooooooooooooo!!!!

    Excelente bom gosto o seu!

    Um abraço!

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