domingo, 7 de novembro de 2010

O deserto - Albert Camus


(...) Viver é certamente um pouco de exprimir (...). Viver é testemunhar três vezes, no silencio, na flama e na imobilidade!

Se Rimbaud terminou seus dias na Abissínia sem escrever uma só linha, não foi pelo gosto da aventura nem por renúncia à sua condição de escritor. Foi “porque a coisa é assim mesmo” e porque, num certo ponto de nossa consciência, terminamos por admitir justamente aquilo que todos nos esforçamos por não compreender, conforme nossa vocação. Percebe-se claramente que, nesse caso, se trata de empreender a geografia de um certo deserto. Mas esse deserto singular não é sensível senão àqueles capazes de nele viverem, sem jamais eludir a sede. É então, e somente então, que ele se povoa das águas vivas da felicidade.

Pois conheço certos momentos e lugares em que a felicidade pode parecer-nos tão amarga que preferimos apenas sua promessa. Isso porque, nesses momentos ou nesses lugares, eu não tinha coragem bastante para amar, isto é, para não renunciar.

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